O meu primeiro contacto com o cancro

 Apesar de eu próprio, já ter vivido e estar atualmente a viver com uma doença oncológica, a minha primeira experiência de perto foi quando o meu pai foi diagnosticado com cancro no pulmão.

Lembro-me que a notícia foi um choque para todos os que lhe eram próximos - nunca pensamos que estas coisas nos podem tocar a nós ou aos nossos.

Na altura, ainda não existiam tantos desenvolvimentos na medicina, o que restringia muito o otimismo com que deveríamos encarar a doença. Foram momentos difíceis desde o diagnóstico, passando pela cirurgia e demais tratamentos.

Lembro-me que procurei terapias alternativas e li e reli artigos e informações sobre o que no mundo se fazia no combate ao cancro do pulmão- motivado e ansioso por contrariar a crua realidade da ineficiência dos tratamentos convencionais existentes.

Penso que a maior parte dos que são afetados, direta e indiretamente, após o choque inicial tenham esta vontade de pesquisar e tentar encontrar o próximo milagre da medicina que ajudará na cura. Foi o que comigo aconteceu. Foram dias e semanas de pesquisa, que foram fazendo crescer a minha crença de que seria possível encontrar uma solução. E apesar de isto me ter permitido acalentar alguma esperança e tenha buscado por soluções, acho que o meu pai se entregou demasiado rápido. No fundo, foi uma forma de eu próprio conseguir lidar com a ideia que ele estava afetado por uma doença que há altura era, invariavelmente, mortal.

Por outro lado, o meu pai era uma pessoa demasiado reservada, mais ainda que eu próprio, o que dificultou percebermos o seu estado de espírito e vontade para encarar e focar-se numa cura da doença.

Nos anos 60 do século XX, o meu, na altura, jovem pai, seguiu para Angola para lutar na guerra colonial.  Apesar de nunca nos ter falado sobre isso, acredito que regressou a Portugal com muitos fantasmas, do que por lá vivenciou, mas que nunca connosco partilhou.  Memórias negativas guardadas para ele próprio. Da mesma forma guardou para si o que realmente sentia após o diagnóstico de cancro. Além disso, o meu pai era fumador, só tendo parado depois do diagnóstico. Eu próprio comecei a fumar com 16 anos, na altura toda a envolvência do tabagismo era propicia a que muitos como eu tenham começado a fumar.

Tenho a certeza que o fator psicológico, a sua forma de estar, sem demonstrar emoções, aliado ao facto de ser fumador, não sendo a causa única, muito contribuíram para o aparecimento da doença.

Hoje, com o que conheço sobre o cancro, teria agido de outra forma, procuraria estar mais próximo e mais interventivo, ao invés de seguir ao sabor do conformismo que sempre senti por parte dele. Desejei que pudesse ter sido mais vulnerável connosco, e teria procurado criar um espaço de conforto emocional. Esse, seria o tipo de apoio que poderia ter dado, e não tanto a procura de soluções tangíveis. Tentaria moldar e alterar o meu foco, pois agora sei que o dele nunca foi curar-se, mas sim sempre em deixar tudo rolar até ao fim.

Para se combater o cancro, como qualquer outra doença, a nossa vontade e crença na cura é fundamental, e para isso temos de ter uma mente musculada por pensamentos positivos. Mas sobretudo, devemos manter o foco no que queremos para o nosso futuro: ultrapassar a doença e retomar a nossa vida, tendo consciência que após esta experiência nada voltará a ser igual.

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